Misturança

Brincando com a literatura e, quando possível, com tudo que tenha a ver com arte.
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sexta-feira, 26 de setembro de 2014


Bentinho procura Sherlock

- Oi, o senhor é o Sherlock Holmes?
- Sim, o que o senhor deseja? – Holmes perguntou enquanto acendia seu cachimbo tranquilamente.
- Sr. Holmes, eu sou o Bentinho, muito prazer – Estendeu a mão com um olhar amistoso, mas visivelmente agitado e desconfortável.
- Prazer... O senhor deve ser brasileiro, se não estou enganado.
- Sim, sou sim.
- Foi o que pensei, o seu nome é bem típico.
- É... Bem, Sr. Holmes, eu vou direto ao assunto: eu preciso da sua ajuda para descobrir se minha mulher me traiu ou não. 
Holmes olhou para Watson que se encontrava num canto da sala, lendo o jornal, porém prestando atenção à conversa e ao novo visitante. Watson retribuiu o olhar de modo significativo.
- Quais são suas suspeitas, Sr. Bentinho? – Perguntou demonstrando uma certa indiferença.
- Eu acho que minha mulher, Capitu, me traiu com um amigo já falecido, e suspeito também que nosso filho seja, na verdade, filho dele. – Bentinho falou tudo de uma vez, num tom baixo e áspero, assim que terminou, parecia um tanto aliviado.
-Sei... E o que o leva a pensar que ela tenha traído o senhor com esse cavalheiro que faleceu?
- Bom, na verdade não existe nenhum fato concreto que me leve a suspeitar dela, tudo o que eu tenho como suspeita é um olhar de tristeza e saudade que pude perceber em seus olhos no enterro desse nosso amigo, que ela lançou tão comovidamente sobre o túmulo. E, também, não posso deixar de negar que o nosso filho se parece muito com Escobar.
- Ora, senhor, me perdoe, mas estas suspeitas são unicamente baseadas em suposições de um marido ciumento. Como o senhor mesmo relatou, não há nenhuma prova concreta desse adultério, e desde que o suposto amante se encontra dentro de um caixão, a sete palmos da terra, posso dizer sem sombra de dúvida que é praticamente impossível descobrir se algo realmente aconteceu entre os dois – Holmes falava num tom impaciente e quase ríspido, não tinha tempo para tratar de um caso que poderia muito bem ser fruto da mente paranoica daquele homem. A não ser, é claro – continuou um pouco mais calmo, vendo a expressão desapontada do pobre homem – que sua mulher confesse o acontecido.
- Não, Sr. Holmes, estou aqui escondido, quero dizer, não quero que Capitu suspeite de nada, simplesmente não posso chegar e perguntar a ela: Olá, meu amor, você por acaso me traiu com Escobar? Não, não, isso nunca.
A impaciência de Holmes explodiu. – Sr. Bentinho, o senhor tem um volume de sua obra de origem? – Sim, respondeu ele, entregando um bonito exemplar de Dom Casmurro ao detetive. 
– Muito bem, analisarei a obra e se descobrir alguma coisa eu aviso o senhor, obrigado, tenha um bom dia. 
Logo que Bentinho saiu, Holmes iniciou a leitura do livro, o qAual terminou em dois dias.
- Watson, é realmente impossível saber se essa traição aconteceu mesmo, lendo este livro. Acho que a única saída é conversar com esse senhor Machado de Assis. – Olhou, decidido, para o amigo, acendeu o cachimbo e disse: 
-Watson, chame um carro de aluguel!

Dom Casmurro - Machado de Assis
A volta de Sherlock Homes - Arthur Conan Doyle


2 comentários:

Lizandra Souza disse...

Ain s2 ficou muito bom, Machado e Doyle estão entre meus escritores favoritos e essa mistura intertextual ficou demais!

Unknown disse...

Muito bom!!!

Nem mesmo Sherlock para desvendar esse mistério hein...
:)