Misturança

Brincando com a literatura e, quando possível, com tudo que tenha a ver com arte.
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domingo, 28 de dezembro de 2014

A morte dupla

Primeiro chegou Gabriel, da Cidade do México, já a noitinha. Depois, João Ubaldo, do Rio de Janeiro. Foram encaminhados diretamente para a ala latino-americana, naturalmente. Gabriel encarou por uns breves minutos aquele homem gordinho, de óculos, que parecia conhecer. Aproximou-se.
- Olá, chegando agora? - Perguntou tentando ser simpático.
- Claro, acabei de passar pelo portão, não viu? - Deu uma risada forte. Muito bom te encontrar aqui, Gabriel. Quer dizer, não tão bom assim, melhor se estivéssemos fumando um cigarrinho, num bar qualquer, não é mesmo?
- É, não fumava há um bom tempo, mas agora fiquei com vontade. Acho que não tem problema né, afinal, o que poderia acontecer? Morrermos de novo? - João gargalhou. Ir pra uma ala pior do céu? - Continou Gabriel, meneando a cabeça e coçando o bigode.
- Ouvi falar que essa nossa ala é uma das piores. Em respeito à vida real, sabe como é né? – João parecia meio contrariado.
- Será que se eu tivesse morrido em Nova York teria alguma vantagem ou eles só consideram o país natal? - Gabriel brincou.
- Meu velho amigo, o latin american way of life é uma marca indelével.
Os dois caminhavam por uma rua de terra que não se via o fim nem o começo. Às vezes passava um conhecido, cumprimentavam-se e seguiam viagem.
- Sabe que gostei muito de A casa dos budas ditosos, franco, cru, real. Sempre pensei que o meu velho de Memórias de minhas putas tristes poderia ter cruzado com aquela tarada em algum conto. - Olhou longe, pra um horizonte perdido em poeira. João olhou-o, meio perplexo.
- Não vejo nexo nisso, seu velho era um filho da puta romântico.
- Então, tem alguma coisa mais romântica do que querer dar prazer a alguém? - Bateu nas costas do amigo, baixou a cabeça como que resignado por nunca ter pensado em escrever sobre tal encontro.

- Olha o Chico Xavier vindo ali, vou pedir pra ele dar essa ideia pra alguém, e que seja alguém talentoso! 

A casa dos budas ditosos - João Ubaldo Ribeiro
Memória de minhas putas tristes - Gabriel Garcia Marquez

3 comentários:

Lizandra Souza disse...

Oi, adorei seu textos, acho genial a forma como vc usa a intertextualidade (fazer conexões entre obras diferentes) para criar seus textos. Já tentei fazer isso com Shelley e Stoker.
Beijo!

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

Livia, que texto excelente!!
Adorei a forma como vocês escreve e sua ideia foi genial!

Não conheço o João Ubaldo mas adoro Gabriel Garcia, aliás preciso ler mais livros dele!

Muito bom! Ganhou uma seguidora :)
Abraços!!